Há algum tempo atrás, cerca de duas décadas aproximadamente, a juventude não era reconhecida no Brasil como um segmento populacional distinto e carente de políticas públicas específicas, logo, quando havia a necessidade de dialogar ou referir a esta faixa etária, dirigiam ao movimento estudantil, que possuía nesse contexto histórico, grande visibilidade e protagonismo. A juventude surgia do movimento estudantil, mas houve a inversão deste conceito e hoje, o estudante se localiza no seio da juventude em geral.
O próprio aparecimento de organizações e grupos juvenis com atuação em campos diversos – não apenas da vida estudantil e político-partidária,mas também da cultura, da vida comunitária, das estratégias inovadoras de geração de renda, entre outros – impulsionou o reconhecimento das questões específicas que os afetam. Desse modo, o movimento estudantil não possui mais o monopólio da representação juvenil. Yes!
Essa melhor compreensão do desenvolvimento histórico e contradições sociais, diversidade juvenil e base sócio-política concentrada em estruturas permanentes, resguardam a especialidade do movimento estudantil diante dos demais movimentos juvenis.
É o que caracteriza o movimento estudantil como a “classe fundamental” da juventude, todavia, uma “classe fundamental” que, ao invés de aprimorar sua capacidade dirigente, vem perdendo espaços justamente no terreno das transformações reais da vida da população de 15 a 29 anos para outras formas associativas, porque é incapaz de atualizar sua estratégia.
Isso quer dizer que, ao contrário dos operários, o movimento estudantil não necessariamente deve nascer como movimento defensivo. Não é apenas porque o banheiro está quebrado que o estudante pode e deve se organizar. O movimento estudantil tem condições de ser a força que acimenta um bloco histórico das juventudes pela superação da condição social, marcada pelo signo “menos”, estratégico, consequentemente, do ponto de vista geracional, para a construção de um país justo e desenvolvido.
Os esforços do movimento estudantil tradicional se voltam a dois pontos-chaves: o primeiro, em canalizar a escola ou universidade para uma luta exclusivamente educacional, centrada nas “lutas econômicas”, por infra-estrutura, mais verbas, melhores salários para professores, democracia administrativa interna, ou, então, para políticas públicas dentro da escola, a assistência estudantil. A luta “estratégica” seria a reprodução da “tradição” do movimento estudantil brasileiro, de engajamento nos temas gerais do país, e o segundo, em tentar repetir como farsa, mesmo que involuntariamente, o estereótipo dos anos 60 e 70, direcionando-se para uma perspectiva de formar militantes para uma luta “revolucionária”, através, inclusive, do uso “tático” de elementos da grade curricular, para uma luta que seria “essencialmente operária”, da “classe estratégica que produz mais-valia”.
Em Dourados, nem ao menos sequer temos um movimento estudantil concreto, com poder representativo. Por onde anda a União Douradense de Estudantes (UDE)? Encontramos apenas raros estudantes – somente no ensino superior e não em todas as universidades – que possuem majoritariamente um discurso revolucionário, meramente ilustrativo e que estrategicamente, para dotarem de seriedade e serem vinculados a fortes instituições da classe, ostentam nos lugares e das formas mais visíveis, bandeiras replicadas, como da lembrada UNE.
Como exemplo, no último aumento da tarifa do transporte coletivo – sem julgo de ser necessário ou não – notamos apenas uma minúscula quantia de estudantes, dos milhares, cerca de trinta, em protesto.
Será que os estudantes de hoje, apesar de insistirem, desnecessariamente, em manter a tradição do movimento, não sabem o significado e a responsabilidade da representatividade? Pergunto se ao menos procuraram saber a justificativa do aumento da tarifa para posteriormente, julgá-la.
É triste ver os caminhos que o movimento estudantil brasileiro está tomando. O Tribunal de Contas da União investiga repasses de dinheiro público – que eu e você paga - destinados à União Nacional dos Estudantes, e já descobriram que parte dos recursos foram usada irregularmente na compra de uísque escocês, vodca e caixas de cerveja. Desde 2003, a entidade já recebeu mais de R$ 42 milhões do Governo Federal, e em 2010, foi indenizada com R$ 44 milhões para construção da sede própria.
Outro ponto estarrecedor: enquanto a população clama por mais segurança, fiscalização, presença efetiva dos policiais, esse movimento exige o afastamento das rondas policiais no campus da USP, pra boa coisa não deve ser! Para este diagnóstico, não precisamos ir longe, em Dourados, a maioria dos supostos “representantes estudantis” só se manifestam em ações revolucionárias, motivadas pelo impulso e de cunho partidário ou quando precisam se posicionar na briga por viagens turísticas e de lazer pelo país, maquiadas como eventos estudantis bancados com recursos públicos. É comum também, não encontrarmos o suposto movimento nos lugares que mais deveriam estar, em importantes espaços de discussão política, imprescindíveis para garantir a qualidade da educação e o benefício dos estudantes, como as audiências públicas e conferências. Este segmento obrigatoriamente precisa ter tímidas relações com os órgãos gestores e de controle social da juventude e educação, prioritariamente.
Há muito que discutir e principalmente o que fazer. Na recente Conferência de Juventude da Grande Dourados, a própria juventude apontou a necessidade de terem na escola, aulas sobre cidadania e política, propondo até mesmo a volta na grade curricular, a disciplina “Organização Social e Política Brasileira (OSPB), isso é esplêndido!
A esperança é que gradativamente, encontramos grupos de estudantes comprometidos apenas em melhorar as condições de ensino e não promoverdeterminada ideologia assumindo tais espaços, porém sem vínculo partidário, quebrando tradições nas universidades públicas brasileiras.
Gleiber Nascimento é internacionalista, presidente do Conselho Municipal de Juventude e assessor parlamentar
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